"TENDÊNCIAS EVOLUTIVAS DO JOGO DE FUTEBOL"

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Se o jogo de hoje já não é o que era, com a mesma certeza se afirma que o futebol de amanhã não será aquilo que hoje se conhece. Todavia, só se compreende a mudança se se compreender objetiva e corretamente aquilo que na realidade está a mudar. Logo, o problema fundamental é encontrar um instrumento de análise que compatibilize a velocidade de entendimento do jogo e o ritmo de mudança pois, como tudo na vida, só a mudança é certa.

Analisa-se, estuda-se e por vezes imitam-se as equipas que mais vezes atingem a vitória, mas também aquelas equipas que provocam uma certa fascinação suportada pelos treinadores e jogadores que têm a coragem de revolucionar o conhecido em direção a uma nova e mais atrativa forma de modificar o que é “norma” fazer-se. No alto rendimento, o mais importante e o mais difícil, seja qual for o nível competitivo em que se esteja inserido, é atingir a vitória. Mas nem sempre jogadores, equipas e treinadores que atingiram um elevado número de vitórias nas competições de alto nível perduraram muito tempo no imaginário futebolístico; ou seja, são reconhecidos e homenageados mas não atingiram a “imortalidade”. A história do futebol apresenta múltiplos exemplos de jogadores, equipas e treinadores de enorme valor que, nos momentos mais importantes e decisivos, não conseguiram a vitória, protelando quase toda a sua vida para atingir essa máxima essencial do futebol: o ganhar. Todavia, muitos deles ficaram na memória do futebol, porque trouxeram algo de novo, de diferente, marcando indelevelmente a evolução do jogo. Assim, por esta e por outras razões, seduziram e arrebataram o pensamento e a memória de quem presenciou e historiou esses feitos.

A análise das características particulares das competições na atualidade, em especial da Liga dos Campeões, possibilita a observação de tendências transformativas do jogo, as quais terão repercussões na orientação metodológica do processo de treino. Na verdade, o processo de transformação e evolução do jogo tem um carácter sistémico; isto é, o melhoramento de um ou mais fatores constituintes afecta não só esse elemento, como também o desempenho de todos os outros, influenciando radicalmente todo o sistema, não só de modo positivo mas também negativo. Os treinadores visionam o futuro partindo dos conhecimentos do presente na direção do futebol desejado, enquanto os jogadores empenham-se na transformação individual e colectiva, jogando no limite da sua sabedoria e capacidade.

1. PREPARAÇÃO E CONDUÇÃO DO JOGO

1.1. JOGAR PERMANENTEMENTE EM “UNIDADE”

(1) Desenvolver uma mentalidade colectiva. Para tal pretende-se: (i) incrementar a eficácia de jogo da equipa através de atitudes e comportamentos de carácter colectivo em que: todos atacam e todos defendem; (ii) sublinhar que o problema estratégico/ tático de um ( jogador) é o problema de todos (equipa). O conceito de jogador ativo não significa somente a intervenção sobre a bola, mas consubstancia a disponibilidade total dos jogadores para intervirem em qualquer fase, etapa e momento do jogo ofensivo ou defensivo.

(2) Promover rotinas individuais versus coletivas. Esta perspetiva acarreta: (i) realizar movimentações coordenadas com caráter convergente e divergente, conjugadas em largura e profundidade no ataque, e de concentração na defesa; (ii) equilibrar e racionalizar a repartição dos jogadores no terreno de jogo, tendo em atenção as particularidades e exigências de cada fase, etapa e momento de jogo.

(3) Comprometer o individual no quadro coletivo. Este comprometimento obriga a: (i) dinamizar interações inerentes às diferentes missões táticas dos jogadores, numa dimensão de racionalidade estrutural e funcional, respeitando o perímetro dos fundamentos de identidade e integridade de um determinado modelo de jogo; (ii) responsabilizar mutuamente os jogadores na resolução das diferentes situações de jogo, dando a todos eles a possibilidade de decidirem e executarem, entre várias opções, a solução tática mais ajustada e adaptada.

1.2. CONCEPTUALIZAR PLANOS ESTRATÉGICO/TÁTICOS.

(1) Elaborar planos de intervenção. Importa que estes: (i) traduzam modificações pontuais e temporárias (funcionalidade especial) da expressão tática de base da equipa, isto é, da sua funcionalidade geral; (ii) permitam o uso de conhecimentos e o estudo das condições objetivas, sobre as quais se realizará a futura confrontação desportiva (adversário, terreno de jogo, condições climatéricas, etc.).

(2) Dialogar em condições competitivas. Esta premissa obriga os jogadores a: (i) minimizar ou anular os aspetos mais eficientes da expressão táctica coletiva e individual da equipa adversária, bem como evidenciar as suas carências de preparação; (ii) treinar em cenários próximos das condições objetivas da futura competição desportiva, num circuito em que o treino é jogo e o jogo é treino.

(3) Redimensionar o plano no decurso da competição. Neste quadro importa estabelecer planos estratégico/táticos: (i) deliberados, sendo operacionalizados no desenvolvimento e aperfeiçoamento de uma forma específica de jogar (modelo de jogo), o qual contempla formas alternativas de jogar que se constituam como variantes; (ii) emergentes, desenvolvendo-se atendendo às condições competitivas, em virtude de nem sempre os cenários de jogo se reproduzirem como se perspetivava (num sentido positivo ou negativo).

1.3. MARCAR PRIMEIRO VERSUS FINALIZADORES

(1) Marcar primeiro. As análises evidenciam que as equipas que marcam primeiro em 62% dos casos atingem a vitória, 19% terminam em empate e somente 16% acabam por perder. Em relação às equipas que marcaram o segundo golo, 93% atingiram a vitória, 6% empataram e, somente 1% acabou por perder o jogo.

(2) Liderar o resultado do jogo. As análises do jogo demonstram que: (i) liderar o resultado do jogo tem um efeito de caráter psicológico positivo nos jogadores e na equipa, dando-lhes maior segurança e confiança; (ii) liderar o resultado do jogo tem um impacto de carácter estratégico/tático em que a equipa adversária se sente na obrigação de assumir um maior número de riscos e a perder clarividência, em função do passar do tempo.

(3) Alternar o resultado do jogo. As análises do jogo esclarecem que: (i) as maiores percentagens dos resultados do jogo de futebol situam-se numa banda que varia entre o 0 a 0 e os 2 a 1 (perfaz mais de 45%). Deste facto constata-se a reduzida possibilidade de alternâncias relativas ao comando do resultado numérico de jogo, durante o seu desenvolvimento; (ii) o resultado final do jogo de futebol é normalmente baixo; logo, recuperar de um resultado negativo durante o próprio jogo é, segundo as análises, uma tarefa que se afigura difícil, mas não impossível.

1.4. ANTECIPAR A MATURIDADE FUTEBOLÍSTICA

(1) Admissão antecipada à alta competição. Observa-se na atualidade e numa perspetiva de futuro, o sucesso dos jogadores mais jovens nas competições de elevado nível de rendimento. No Campeonato do Mundo de 2010, havia 123 jogadores com idade inferior a 23 anos (17% e no Campeonato do Mundo de 2014 estes representaram 15%). Destes, 99 jogaram, o que representa 80%. Este facto deriva: (i) ampliação da preparação desportiva dos jovens, que começam mais cedo as suas experiências futebolísticas; alguns deles terão no mínimo 10 a 12 anos de prática antes de chegarem ao alto rendimento; (ii) aplicação desde muito cedo de programas específicos de treino e competição, que “afetam” os jogadores devido à mobilização de fenómenos de natureza adaptativa de carácter mental e motor.

(2) Prolongamento da vida profissional. Verifica-se uma maior longevidade desportiva dos jogadores. Dos 736 jogadores inscritos no Campeonato do Mundo de 2010, havia 207 jogadores com idade igual ou superior a 30 anos (28% e no Campeonato do Mundo de 2014 estes representaram 23%). Entre os 30 e os 32 (19%, 16% em 2014), entre os 33 e os 35 (7% e 6% em 2014) e mais de 35 (2% e 1,5% em 2014). Este dados derivam do facto de se: (i) aplicar de forma mais eficiente os atuais conceitos e princípios metodológicos de treino; (ii) respeitar um conjunto de pressupostos fundamentais a ter em conta na vida quotidiana de um jogador profissional (alimentação, descanso, etc.).

(3) Qualificação dos processos de treino. Os treinadores têm investido em metodologias específicas de treino. Neste sentido: (i) treina-se com o intuito de conseguir um elevado grau de maturidade futebolística, pensamento estratégico/tático, consistência tático/técnica e capacidade física; (ii) treina-se de forma a atingir elevados níveis de rendimento mantendo-os durante um maior período de tempo possível.

2. ELABORAÇÃO DO JOGO COLETIVO

2.1. COMPATIBILIZAR AS AÇÕES DE ATAQUE VERSUS DEFESA

(1) Relacionar o método ofensivo e defensivo. Esta relação funcional da equipa será operacionalizada numa concordância organizativa da própria equipa, definindo que: (i) atacar e defender são duas fases da mesma lógica do jogo; (ii) atacar e defender de forma simultânea, independentemente de a equipa ter ou não a posse de bola. Assim, ataca-se quando se possui a bola, desenvolvendo-se em condições mínimas para em qualquer momento concretizar os objectivos defensivos. Pelo contrário, defende-se quando a equipa não tem a posse de bola, desenvolvendo-se em qualquer momento os pressupostos inerentes à fase ofensiva.

(2) Explorar diferentes níveis organizacionais da equipa. A compatibilidade operacional entre os métodos de ataque e defesa possibilita: (i) explorar diferentes níveis organizacionais da equipa com o intuito de ascender a uma etapa ofensiva ou defensiva mais favorável à consecução dos objetivos do jogo; (ii) criar condições propícias de se transitar de um estado organizativo da equipa para um outro mais favorável, sabendo também que este se pode precipitar num outro menos favorável.

(3) Assegurar adaptações aos métodos de jogo do adversário. Estas adaptações têm como intencionalidade tática os seguintes objetivos: (i) estabelecer medidas de caráter preventivo tendentes a contrariar a eficácia da organização da equipa adversária, bem como as particularidades dos jogadores que a potenciam; (ii) constranger a equipa adversária a defender ou a atacar com um menor número de jogadores ou com os jogadores de menor qualidade, reduzindo-lhes as possibilidades de êxito.

2.2. FOMENTAR RÁPIDAS TRANSIÇÕES DE FASE

(1) Potenciar uma atitude mental. Os momentos de transição de fase suportam-se na base de uma: (i) predisposição mental (forte atitude) dos jogadores transitando: (i) da defesa para o ataque ou do ataque para a defesa; pela (ii) visão ofensiva permanente do jogo, através da qual se ataca a bola, no sentido de a recuperar ou, estando na sua posse ataca-se a baliza adversária com o intuito de concretizar o golo.

(2) Dinamizar decisões/ações. A eficácia da transição pode ser: (i) rápida, no sentido de direcionar a bola para a baliza adversária (no ataque) ou, de reagir de imediato à perda de bola (na defesa); (ii) imediata, manifestada pela reação de todos os jogadores da equipa, logo após a recuperação da posse de bola (no ataque) ou, pressionando o atacante de posse de bola e todos aqueles melhor posicionados (na defesa); (iii) segura, através da maximização de ações que evitem a perda extemporânea da bola (no ataque) ou, através de ações de temporização do ataque adversário (na defesa); (iv) adaptada, em consonância com uma correta avaliação dos níveis de organização defensiva ou ofensiva do adversário.

(3) Fomentar a continuidade lógica do jogo. Os momentos de transição de fase só terão sucesso quando se desenvolvem fazendo parte da continuidade lógica das fases de ataque ou de defesa. Neste sentido: (i) os momentos de transição de fase não se suportam numa visão fragmentadora do jogo, mas sim no quadro de uma continuidade lógica de ação; (ii) os momentos de transição de fase convergem num sentido único e são parte integrante de uma das fases do jogo (ataque ou defesa).

2.3. DINAMIZAR CIRCULAÇÕES TÁTICAS.

(1) Intencionalidade. Equacionam-se os seguintes elementos: (i) os padrões de jogo de uma equipa têm a propensão para conservar ou progredir no terreno de jogo, de modo a atacar a baliza adversária com o intuito de concretizar o golo (no plano ofensivo), ou de recuperar rapidamente a bola, bem como de contemplar a máxima proteção da baliza contra as investidas do adversário (plano defensivo); (ii) os padrões de jogo desenvolvem uma coordenação coletiva inteligível e dinâmica, de modo a diminuir igualmente a resistência psicológica e moral da equipa adversária.

(2) Reversibilidade. Os padrões de jogo são construídos e operacionalizados prevendo mecanismos automáticos de auto-organização da equipa. Neste sentido, adequam-se duas possibilidades básicas de evolução: (i) alterar o desenvolvimento do processo saindo de espaços de pressão (no ataque) ou através de movimentações compensatórias e adaptáveis às súbitas mudanças do momento e ângulo de ataque (na defesa); (ii) passar à fase de jogo subsequente. As rotinas de jogo devem prever as situações de perda ou de recuperação da posse de bola, criando-se mecanismos táticos de suporte à passagem à fase de jogo subsequente (transição).

(3) Acessibilidade. Os padrões de jogo são conceptualizadas no âmbito de um elevado nível de acessibilidade no que se refere à sua aquisição. Sendo perspetivadas pela: (i) simplificação de processos de caráter ofensivo ou defensivo; (ii) aquisição rápida dos conteúdos estratégico/táticos de base para a sua realização; (iii) edificação de um elevado potencial de desenvolvimento e evolução da rotina de jogo a aplicar.

2.4. EXPLORAR SITUAÇÕES DE BOLA PARADA

(1) Rentabilizar e maximizar as situações de bola parada (representam entre 25% e os 50% das situações de criação e de finalização). Nos jogos entre equipas com os mesmos níveis de rendimento, estes são decididos, numa maior proporção, através de golos que derivam de esquemas táticos. Assim, pretende-se no ataque: (i) ampliar o conjunto de pressupostos estratégico/táticos cujo planeamento, preparação e aplicação na competição oferecem um conjunto de vantagens no que se refere à iniciativa, ao tempo e à oportunidade; (ii) aplicar medidas preventivas com o intuito de minimizar o eventual risco de uma perda extemporânea da posse de bola.

(2) Preparar para contra-atacar. Em virtude da equipa que beneficia da situação da bola alterar de forma “radical”, mas consciente e pré-programada, da sua estrutura e funcionalidade, do ponto de vista defensivo importa: (i) preparar consistente e persistentemente processos de transição defesa/ataque; (ii) influenciar a capacidade da equipa atacante de responder individual e coletivamente à iniciativa dos adversários (defesas), logo que se verifica uma perda momentânea ou total da posse de bola; (iii) convidar a equipa atacante a criar uma falsa noção do controlo do jogo, em que os defesas “armadilham” as ações dos adversários, trabalhando individual e coletivamente, sempre com o intuito de marcar atacantes e espaços vitais de jogo e, preparando-se para transitar de fase, desenvolvendo e terminando a consequente ação de ataque, com elevados níveis de êxito.

3. DIMENSÃO DECISÃO/AÇÕES  DE JOGO

3.1. INCREMENTAR A QUALIDADE TÉCNICA

(1) Antecipar e acelerar a solução técnica. Esta perspetiva acarreta a necessidade de: (i) prever e preparar. A qualidade técnica dos jogadores deriva da intervenção de processos cognitivos que se expressam pela capacidade destes, não só prever o resultado, mas também, de agir no momento certo na resolução das situações de jogo; (ii) decidir e atuar. Na atualidade e no futuro próximo, os jogadores têm de decidir bem e executar melhor. Deste modo, antecipam o seu comportamento em função do prognóstico e executam uma ação que seja previsível aos olhos dos seus companheiros e imprevisível aos dos adversários.

(2) Adequar a solução técnica. As ações realizadas no sentido de solucionar as diferentes situações de jogo, adequam-se em função de um conjunto de relações, as quais são determinadas pelo espaço, pelo tempo e pelas opções possíveis de intervenção: (i) relação espaço/tempo; (ii) relação espaço/ ação; (iii) relação opções/ação.

3.2. ESTIMULAR A CRIATIVIDADE E A IMPROVISAÇÃO

(1) Incrementar a autonomia versus criatividade e originalidade. Neste âmbito evidencia-se a: (i) autonomia versus adaptabilidade. O rendimento de uma equipa depende do pensamento autónomo dos jogadores que a constituem; (ii) autonomia versus tomada de decisão. A necessidade de se encontrar intervenções táticas originais e adaptadas, permite a cada jogador decidir aquela que, dentro dos limites das suas missões táticas, melhor sirva os interesses estratégico/táticos da equipa em cada momento do jogo; (iii) autonomia versus disciplina tática. O rendimento de uma equipa de futebol exige dos jogadores uma forte disciplina tática, aliada a uma sólida aplicação de ações que reclamam comportamentos criativos.

(2) Conjugar a previsibilidade versus imprevisibilidade. A intervenção dos jogadores nas situações de jogo realizam-se numa relação do previsível e do imprevisível. Assim, importa entender o: (i) espaço do previsível. No jogo existe uma dimensão previsível cuja intervenção é suportada pela aplicação de princípios de jogo pré-estabelecidos, derivando de padrões comportamentais parametrizados pelo modelo de jogo; (ii) espaço do imprevisível. No jogo existe uma dimensão menos previsível que resulta da aleatoriedade da situação, a qual, será resolvida pelas margens de criatividade e autonomia dos jogadores, no quadro das fronteiras ou do perímetro do modelo de jogo da equipa.

(3) Compatibilizar a regra versus flexibilidade tática. Todo o comportamento técnico expresso pelos jogadores é parametrizado pelo: (i) imaginário disciplinado e flexível. Criam-se condições para que os jogadores atendam a um imaginário, ao mesmo tempo disciplinado pelos contornos do modelo de jogo e flexível, proporcionando a emergência da criatividade e a autonomia; (ii) regras de ação e desvios criadores. A criatividade nasce de uma cultura de regras de ação e de princípios de gestão do jogo coletivo. Sendo suficientemente flexíveis para permitir, em certas circunstâncias, “desvios criadores” na resolução das situações de jogo.

3.3. INCENTIVAR A INTENSIDADE DE JOGO.

(1) Caracterização do esforço físico. As análises dos esforços despendidos pelos jogadores durante a luta competitiva caracterizam-se pela: (i) intermitência (alteram fases de não atividade com fases de elevada exigência); (ii) a duração do esforço é variável, situando-se entre um e 5 segundos; (iii) a intensidade varia entre reduzida e máxima; (iv) a densidade dos esforços é elevada, não permitindo a recuperação completa da ação realizada; (v) a frequência de intervenção no jogo, de forma direta ou indireta, é repartida de forma aleatória e imprevisível.

(2) Sincronização coletiva versus esforço físico. Uma eficaz estrutura e funcionalidade da equipa promove uma melhor racionalização dos gastos energéticos, incrementando as “reservas” para a aplicação dos recursos de ordem estratégica, tática e técnica. Por conseguinte, importa entender as seguintes relações: (i) sincronização versus recrutamento energético. Quanto maior for o grau de coerência, racionalidade e sincronização da ação coletiva, menor será o recrutamento dos mecanismos de suporte dos sistemas de ação. Logo, ao reduzir-se os gastos energéticos sem se pôr em causa a eficácia comportamental da equipa, amplia-se a disponibilidade e as possibilidades de intervenção dos jogadores, noutras tarefas competitivas; (ii) nível organizativo versus mínimo energético. Para um determinado nível de organização da equipa, mobiliza-se um “mínimo energético” indispensável à sua consecução. As fontes energéticas disponíveis potenciam acelerações do ritmo de jogo, em momentos e espaços próprios aos objectivos da equipa e aperfeiçoam a orgânica da equipa no plano individual, setorial e inter-setorial.

4. DIMENSÃO OFENSIVA DO JOGO

4.1. ELEVAR O RITMO/TEMPO DE ATAQUE

(1) Simplificar os processos ofensivos. Esta simplificação tem como base: (i) terminar rapidamente o processo ofensivo; (ii) executar decisões/ações que objetivem constantemente situações de rotura da organização defensiva adversária; (iii) incrementar a capacidade de iniciativa, improvisação e criatividade dos jogadores; (iv) dificultar as ações de marcação sobre os atacantes, através de deslocamentos de trás para a frente da linha da bola; (v) eliminar pontos fixos que se possam constituir como referenciais de marcação, relativamente aos adversários, sobrando somente o referencial espaço vital de jogo.

(2) Rentabilizar o binómio tempo/espaço. Para tal é essencial: (i) ajustar decisões/ações perante a contingência e a conjuntura de cada situação de jogo, que só terá êxito se o quadro relacional tempo/espaço for corretamente utilizado em cada momento do ataque; (ii) verticalizar as ações de jogo, tendo como alvo primordial a baliza adversária; (iii) provocar uma persistente instabilidade da organização da defesa adversária, uma vez que não existe uma definição clara que espaço de jogo será preponderantemente vigiado e marcado; (iv) fomentar diferentes soluções alternativas (variabilidade) de decisão/ação na resolução das situações de jogo.

(3) Evitar que a defesa adversária se organize. Esta questão manifesta-se através de se: (i) criar e impor uma “taxa” de variabilidade rítmica de resolução das situações de jogo; (ii) incrementar a velocidade das ações ofensivas impedem que os adversários disponham do tempo necessário para evoluir para uma organização mais estável e coesa do seu método defensivo; (iii) sobrepor funções táticas dos defesas, isto é, irracional distribuição destes no espaço de jogo em função da presente conjuntura tática; (iv) fomentar o desgaste tático/técnico, físico e principalmente psicológico dos adversários, cuja função tática primordial é marcar os atacantes que relançam e suportam undamentalmente o ataque.

4.2. EXPLORAR OS CRUZAMENTOS E TERMINAÇÃO DO ATAQUE (JOGO EXTERIOR)

(1) Desenvolver situações de cruzamento. Nas situações de cruzamento é essencial: (i) potenciar situações de jogo nos corredores laterais ( jogo exterior) concretizando condições vantajosas para cruzar com eficácia; (ii) valorizar a posição dos companheiros, estando estes posicionados e preparados para explorar e atacar zonas vitais de terminação do ataque; (iii) interatuar a ação de cruzamento com o nível de organização defensiva e a possibilidade de se tirar vantagem da sua precariedade.

(2) Estabelecer as ações do atacante que cruza. A eficácia do cruzamento suporta-se em: (i) ajustar a intenção tática do atacante à realização do cruzamento. Este é efectuado numa amplitude longa ou curta, utiliza uma trajetória aérea ou rasa, e com ou sem efeito (in ou out”); (ii) executar o cruzamento de forma rápida, espontânea e precisa; (iii) modelar uma potência de cruzamento de forma que a bola atinja o alvo a uma elevada velocidade, não criando problemas acrescidos ao colega na recepção da bola.

(3) Promover as ações de terminação do ataque. Para tal importa: (i) ajustar a ação do atacante que termina o ataque com a do companheiro que cruza a bola; (ii) dinamizar uma decisão/ação que objetive um ataque ao espaço e à bola, a uma elevada velocidade, de modo a surpreender a defesa adversária; (iii) salvaguardar permanentemente uma elevada precisão no contacto na bola. Só desta forma é possível alterar a trajetória da bola na direção mais conveniente para a terminação do ataque.

4.3. ADOTAR O JOGO INTERIOR.

(1) Aplicação do princípio da penetração. Pressupõe a necessidade de se: (i) orientar as ações de suporte a este princípio tático em direção a espaços vitais e estratégicos de jogo; (ii) enganar os defesas através de ações que simulem as verdadeiras intenções táticas, criando e explorando espaços de jogo e linhas de passe; (iii) variar constantemente o ritmo de execução das ações, traduzindo-se operacionalmente com carácter “inesperado” e “explosivo”.

(2) Administração de combinações táticas. A intencionalidade tática destas: (i) visa coordenar as ações de dois a três jogadores de modo a resolver uma tarefa específica de jogo; (ii) objetiva colocar os atacantes em espaços vitais de jogo livres de oposição, romper ou manter o desequilíbrio da organização defensiva adversária; (iii) coordena movimentações, decisões e contactos rápidos sobre a bola, por vezes em espaços reduzidos e com elevada densidade defensiva.

(3) Execução de deslocamentos ofensivos. Paralelamente ao referido importa que os deslocamentos ofensivos sejam realizados para espaços vitais de jogo: (i) mantendo o controlo, ritmo e tempo de jogo, obrigando os adversários a entrar em crise de raciocínio tático; (ii) aproveitando o espaço entre linha e entre linhas no quadro da organização defensiva adversária; (iii) reduzindo o raio de ação dos deslocamentos dos atacantes através de ações de apoio frontal de modo a fixar o momento de ataque e de rotura perpendicular.

5. DIMENSÃO DEFENSIVA DO JOGO

5.1. RIPOSTAR AO ATAQUE (CONTRA-ATAQUE)

(1) Antecipar a possibilidade de perda da bola. Para tal considera-se: (i) manter uma organização defensiva de base (equilíbrio defensivo), que assegura a reorganização do ataque em caso de insucesso deste, ou numa transição ataque/defesa organizada e controlada; (ii) promover uma marcação individual e agressiva a todos os adversários que não estejam diretamente empenhados na defesa da sua própria baliza.

(2) Pressionar logo após a perda de bola. Esta ação é essencial de modo a reganhar a bola ou auferir de tempo para a reorganização defensiva. Assim importa reagir à perda de bola: (i) pressionando de imediato o adversário que a possui de forma premente e contínua; (ii) dinamizando a 2ª linha defensiva (setor intermédio) marcando todos os adversários que estejam nas melhores condições para promover a continuidade do processo ofensivo; (iii) utilizar a infração às leis do jogo. Sendo necessário utilizar a infracção a favor da equipa (o mais cedo possível, o mais longe possível da baliza e em espaços de jogo considerados não vitais).

(3) Recuar caso não seja possível parar o ataque. Logo que as primeiras ações de obstacularização do ataque não têm efeito pretendido importa: (i) dar profundidade defensiva; (ii) forçar os atacantes a circular a bola em direção à sua própria baliza; (iii) criar condições favoráveis para enfraquecer o reduzido desenvolvimento do ataque; (iv) desgastar psicologicamente os atacantes, em especial aqueles sobre quem recai a organização deste método de jogo.

(4) Aplicar o contra do contra. Este conceito baseia-se no facto de se: (i) contrariar os fundamentos tácticos do contra-ataque adversário, recuperando a bola quando estes pretendem transitar para o ataque; (ii) colocar de imediato a bola, após a sua recuperação, nas zonas predominantes de finalização, de modo a beneficiar do contra-movimento da equipa adversária; (iii) terminar o ataque de modo agressivo e rápido. A gestão competitiva do contra do contra-ataque tem um impacto muito positivo para uma das equipas e muito negativo para a outra.

5.2. RECUPERAR DEFENSIVAMENTE

(1) Marcar espaços e atacantes. A recuperação defensiva atende aos seguintes aspetos: (i) rápida adaptação à situação de jogo, desenvolvendo-se a partir da impossibilidade de se recuperar de imediato a bola, logo que se verifica a sua perda; (ii) rápida escolha da informação pertinente. A recuperação defensiva é um verdadeiro exame de maturidade tática, em virtude de os defesas terem de tomar decisões a partir de um elevado número de opções táticas; (iii) rápida marcação a atacantes e espaços de jogo. Esta etapa defensiva é realizada através de uma forte pressão sobre os diferentes atacantes os quais se apresentam como opções tácticas para a continuidade do processo ofensivo adversário. Paralelamente, marcam-se espaços de jogo que variam de importância em função do desenvolvimento do ataque.

(2) Obstaculizar a ação dos atacantes. Durante a recuperação defensiva importa: (i) colocar constantemente problemas que retardem a progressão do processo ofensivo em relação à baliza e possibilitem simultaneamente, a recuperação de bola; (ii) respeitar constantemente uma posição entre o atacante e a própria baliza. Este é o sentido táctico dominante dos defesas, a partir do qual, todas as outras decisões/ações são executadas; (iii) dinamizar uma linha de recuo defensivo o mais rápido possível e decidir pelo caminho mais curto colocando-se entre a bola e a própria baliza.

(3) Ajustar a recuperação defensiva. A recuperação defensiva adaptar-se-á à situação específica de jogo: (i) recuperação intensiva. Todos os defesas ocupam de imediato as posições pré-estabelecidas pelo sistema defensivo, formando um bloco compacto e homogéneo; (ii) recuperação em pressing. Suporta-se numa intencionalidade tática, desde o seu início, de verdadeiras ações defensivas com o intuito de desapossar o adversário da posse de bola; (iii) recuperação em função da situação de jogo. O recuo defensivo deve derivar da capacidade dos atacantes ultrapassarem os obstáculos colocados pelos defesas (pressing).

(4) Fomentar ações de entreajuda. Todo o processo defensivo suporta-se em ações de entreajuda em virtude de se: (i) possibilitar no quadro da equipa, alterações posicionais e de missão tática mantendo a responsabilidade e solidariedade; (ii) potenciar uma organização coletiva estruturada e fundamentada numa cobertura e entreajuda permanente e recíproca; (iii) incrementar ações de entreajuda, em que as falhas individuais são prontamente corrigidas pelos companheiros.

5.3. APLICAR MÉTODOS DEFENSIVOS CONSTRUTIVOS

(1) Desenvolver o ataque equilibrando defensivamente. Não existe separação operacional entre o ataque e a defesa. Assim importa: (i) reorganizar o ataque. Em caso de insucesso do ataque ou após a perda momentânea de bola; (ii) organizar uma defesa temporária. Não sendo possível recuperar a bola, após a sua perca, é fundamental estabelecer-se uma organização defensiva com caráter temporário e em função da emergência da situação, com o intuito de ganhar o tempo suficiente, para que todos os companheiros se enquadrem no dispositivo defensivo da equipa.

(2) Apreender parte da iniciativa do ataque adversário. É essencial defender com a perspectiva de atacar. Assim pretende-se: (i) assegurar parte da iniciativa do ataque, através do deslocamento coordenado dos defesas, ritmo/tempo defensivo e agressividade na marcação sobre o atacante de posse de bola; (ii) utilizar um grande número de jogadores para o cumprimento dos objetivos da defesa, ajustando constantemente as posições em função do desenvolvimento das situações de jogo; (iii) ampliar a bagagem estratégico/tática dos defesas introduzindo e aplicando novos conceitos de articulação da organização coletiva; (iv) evitar mudanças rápidas do ângulo de ataque que prejudicam a manutenção da concentração defensiva, tendo-se de se aplicar critérios de gestão à organização defensiva.

(3) Defender numa perspetiva de atacar. Ser construtivo na fase defensiva significa: (i) ripostar constantemente. Todo o método defensivo terá de antecipar e responder de modo constante, obrigando o ataque adversário a preocupar-se com a proteção da sua própria baliza; (ii) incrementar o binómio ritmo/tempo. Uma defesa agressiva caracteriza-se por um grande número de ações (variação, velocidade e distribuição no tempo) e por um grande espaço de jogo defendido; (iii) recuperar a bola de forma modelar (pré-preparada). As probabilidades de a ação ofensiva culminar em finalização, dependem em larga medida das circunstâncias em que ocorreu a recuperação da posse de bola.

(4) Promover a redução do espaço efetivo de ataque. Para quem defende é essencial reduzir o espaço de jogo, através do qual se: (i) reduz o número de opções táticas de solução das situações de jogo, durante o ataque. O ataque torna-se mais previsível do ponto de vista defensivo; (ii) nega espaço e tempo aos atacantes tornando as suas tarefas difíceis de executar. Diminui-se a iniciativa dos atacantes forçando-os a cometer erros; (iii) potencia a utilização de um bloco defensivo compacto e homogéneo que, por sua vez, se estabelece sob uma solidariedade efetiva entre os defesas.

Referências bibliográficas

Castelo, J., (2009). Futebol. Concepção e organização de 1100 exercícios específicos de treino (2ªed). Lisboa. Visão e contextos

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http://resources.fifa.com/mm/document/footballdevelopment/ technicalsupport/02/42/15/40/2014fwc_tsg_ report_15082014web_neutral.pdf

JORGE CASTELO, treinador
Jorge Castelo é licenciado em Educação Física pelo Instituto Superior de Educação Física da Universidade Técnica de Lisboa e doutor em Ciências do Desporto pela Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de Lisboa, com uma tese subordinada ao tema “Conceptualização de um modelo técnico-tático do jogo de futebol”. Exerceu várias funções na área académica, entre as quais se contam a de professor auxiliar da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de Lisboa, como regente das disciplinas de Metodologia de Treino I e Metodologia do Treino II (opção de futebol - 4º ano); e a de professor associado da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, departamento de Educação Física, Desporto e Lazer. É treinador profissional de futebol, com 35 anos de atividade e passagens por clubes como o Sport Lisboa e Benfica, Sporting Clube de Portugal e Shandong Luneng (China), tendo conquistado 3 campeonatos, duas taças de Portugal, duas supertaças e duas taças dos campeões europeus, entre outros troféus. Para além disso, é instrutor da UEFA e tem 14 livros publicados em sete línguas (português, espanhol, italiano, croata, sérvio, polaco e chinês).


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3 de Janeiro 2018
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Jorge Castelo

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