Os heróis do SC Paivense

SEMPRE EM JOGO

Rochinha e José Rodrigues não ficam em casa no estado de emergência. Um comanda um corpo de bombeiros, o outro é enfermeiro num centro de apoio a toxicodependentes.

A bola parou de rolar no campo do SC Paivense a 13 de março. Foi o dia em que o clube anunciou a suspensão das atividades desportivas, devido à Covid-19. Para o capitão Pedro Rochinha, que já sonhava com a visita do fim de semana ao líder Mortágua, aunciada em flyers por toda a vila, “foi uma tristeza grande ficar sem treinar”. “Porque o futebol é mais que uma paixão. Tinha dois grandes sonhos na infância: jogar à bola e ser bombeiro. Aos 14 anos, concretizei os dois”, explica.

Desde 2015 que Pedro Rochinha comanda os Bombeiros Voluntários de Vila Nova de Paiva, embora pague as suas contas com outra profissão: “Dou aulas no ensino básico e sou comandante dos bombeiros em regime de voluntariado”. Assume as três atividades “com uma boa gestão do tempo”, mas admite que já pensou em pendurar as chuteiras. “Ando para deixar os relvados há anos. Não consigo. Até as minhas filhas me pedem para continuar. Sabem que me faz bem ao físico e à alma”, garante o jogador, de 44 anos, que já leva seis golos apontados nesta temporada. “E a jogar no meio-campo”, graceja.

Pressão sobre os ombros dos bombeiros

Com a pandemia a fustigar o país inteiro, o capitão do SC Paivense passa mais tempo no quartel. Escala equipas para serviços, trata da “parte burocrática” e também vai para o terreno, “um dia por semana”. Curiosamente, os serviços têm diminuído. “Transportamos menos doentes com as chamadas patologias tradicionais; somos chamados menos vezes. Por outro lado, aumentou, e muito, a pressão sobre os nossos ombros”, destaca, a pensar no “rigor mais apertado em todos os procedimentos” dos bombeiros.

“O quartel e as ambulâncias são sujeitos a um processo exaustivo de higienização. Diariamente, há limpeza e esterilização completas de todas as áreas e materiais que usamos. Depois vamos para a rua bem protegidos e concentrados, porque, na verdade, não sabemos o que vamos encontrar”, esclarece, regozijando-se pelo facto de todos os pacientes suspeitos de infeção por Covid-19 transportados “não terem desenvolvido a doença”.

José Rodrigues teme pelo futuro dos pacientes

Tal como o capitão da sua equipa, o centrocampista José Rodrigues, conhecido no futebol como Zezito, tem uma profissão de alto risco em tempos de pandemia. É enfermeiro com especialidade em psiquiatria e trabalha no Centro de Respostas Integradas (CRI) de Viseu. “Tratamos toxicodependentes, alcoólicos, pessoas com diversos comportamentos aditivos. Seguimos perto de 1000 doentes”, revela.

Nesta fase, em que as consultas no CRI estão a ser canceladas, devido à possibilidade de transmissão de Covid-19, José Rodrigues confessa “alguma inquietação pelo futuro” dos seus pacientes. “Antes da pandemia, tinham uma grande proximidade com os profissionais de saúde. Estavam habituados a ter consultas prolongadas, onde se fazia uma avaliação profunda da sua situação física, mental e social. Agora, não podem entrar no nosso gabinete, não podem sentar-se na sala de espera e veem-nos sempre de máscara quando vão buscar a medicação. Além disso, falamos com eles através do telefone”, lamenta o enfermeiro-jogador, de 37 anos.

José Rodrigues acredita que a quarentena poderá revelar-se “uma encruzilhada para os 200 toxicodepentes em terapia por metadona”. Teme tanto as recaídas como um possível contágio: “Estamos a ceder doses maiores de metadona para não se deslocarem tantas vezes ao CRI. Receio que alguns não consigam gerir. A experiência diz-nos que, em tempos de recessão, a procura de canábis e cocaína cresce exponencialmente. Quando sobe o desemprego, os toxicodependentes são os primeiros a cair. Tudo isso, e a falta de dinheiro, agravam ironicamente a situação destes pacientes”. “Não posso ficar indiferente porque o meu trabalho é ajudá-los e vejo-me limitado na minha intervenção”, acrescentou, inconformado.

O irmão PêPê Rodrigues em quarentena no ‘Berço’

Além de jogar no SC Paivense, o enfermeiro José Rodrigues treina os juvenis do Viseu 2001 e na sua terra natal, Viseu, toda a gente sabe que tem um irmão famoso. “O meu mano mais novo [Pêpê Rodrigues] está fazer a quarentena com a namorada em Guimarães. Estamos sempre em contacto. Toda a família”, refere, contando que, mais do que conselhos para escapar à pandemia, o irmão pede-lhe “séries e filmes a toda a hora”.   

“Ele está bem, está tranquilo em casa, a cumprir um plano de treinos que o Vitória SC que lhe passou. Sempre foi caseiro, não gosta muito de sair. Sente saudades de jogar, claro. Eu também sinto, de jogar e treinar os meus miúdos. É um sentimento inevitável para quem gosta do futebol”, interpreta.

Todos juntos pelo bem comum

Desejoso de que a pausa competitiva termine nos campeonatos amadores e profissionais, “porque seria sinal de que vencemos a grande batalha”, José Rodrigues espera que o espírito coletivo tão típico do futebol inspire os portugueses nestes dias de negritude: “Mais do que nunca, dependemos todos uns dos outros e temos o mesmo objetivo: o bem comum. Espero que os portugueses formem um plantel forte e motivado. Assim conseguiremos vencer”.

Recomendações para prevenir o COVID-19.

Mantenha a atividade física.

Preservar a saúde mental.

A FPF considerou, desde o início da pandemia do COVID-19 ser sua obrigação o lançamento de várias iniciativas de apoio à comunidade desportiva assim como o comprometimento total com as suas responsabilidades sociais.  Saiba mais aqui.


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